21 de agosto de 2007

"Blogues proibidos", ou nem tanto (I)

Com a blogosfera portuguesa em efervescência, devido a essa "preciosa" ajuda de José Sócrates, a quem estaremos, "todos", eternamente gratos, eis que por coincidência em Junho passado, ao mesmo tempo que o país, e o mundo, assistia pela primeira vez, a um autor de um blogue, António Balbino Caldeira, Do Portugal Profundo, ser elevado à condição de arguido na sequência de um processo judicial movido por um Primeiro-Ministro, enquanto tal, por considerar a sua honra atingida, é dado à estampa o livro "Blogues Proibidos" de Pedro Fonseca, editado pela "Centro Atlântico".

Li o livro agora, embora já me tivesse apercebido da polémica que o mesmo tinha causado, aquando da sua publicação, quer nos textos de António Balbino Caldeira, quer pela escrita de João Pedro Graça no seu Apdeites, a que o próprio autor do livro não se furtou no seu blogue, Contra Factos & Argumentos.

Atendendo ao conteúdo do livro, o título "Blogues Proibidos" é infeliz, no mínimo, sensacionalista, no máximo.

Nenhum dos seis blogues analisados foi alguma vez proibido de prosseguir a sua edição. Não houve qualquer setença que determinasse o seu encerramento, ou os seus autores foram alguma vez proibidos de voltar a escrever nos blogues respectivos. Aliás como sabemos a eficácia jurídica, a haver uma tal setença, era praticamente nula, excepto se os blogues estivessem alojados em servidores nacionais.

Quando muito, o autor, que nos diz que o título foi escolhido pelo editor, Libório Manuel Silva, e que por isso se mostra agradecido, deveria ter cuidado ao aprovar tal título, para não induzir em erro os leitores. Se o objectivo é vender bem, porque "o fruto proibido é o mais apetecido", no final fica-se com a sensação de se ter "comido gato por lebre".

No entanto não deixa de ser útil a sua leitura, quer para vários aspectos que se põem à blogosfera, mas não só. Também os direitos de autor deste livro estão na berlinda, embora Pedro Fonseca não estivesse à espera disso.

O texto da obra é quase na sua totalidade "copy/paste", a que Pedro Fonseca não se furta graficamente, o que joga a seu favor. Trata-se de uma opção, como qualquer outra, e desde que a lei esteja a ser cumprida, nada a opor. Por usar e, no meu entender, abusar de transcrições de textos dos blogues em análises, dos meios de comunicação social tradicionais, de setenças judiciais, e de escritos de análise e comentário, leva a que o leitor se perca e, às tantas já não sabe a quem pertence aquilo que está a ler no momento: se ao blogue, se ao autor do livro, se a um meio de comunicação, se ao tribunal, etc.

Como leitor, tive que recorrentemente "recuar" à procura do local onde começavam as aspas, para me aperceber a quem pertenciam os extensos parágrafos transcritos, que chegam a ocupar páginas inteiras.

Se Pedro Fonseca tivesse optado por apresentar o texto em formato cronológico seria mais fácil, e o mais indicado para o fim que se pretendia, quer em termos de leitura, quer em termos autorais e do "seu  a seu dono". Essa tentativa de relatar os acontecimentos de forma cronológica identificada é seguido em relação ao caso "Abrupto", embora com deficiências, mas é único.

Se relativamente a cinco, dos seis, blogues escolhidos por Pedro Fonseca há um fio condutor que lhes é comum: terem mexido de alguma forma com os vários poderes instalados no país a nível político, cultural, judicial e comunicacional, já o blogue "Abrupto" destoa.

Os problemas de pirataria informática de que o "Abrupto" foi alvo, e cujos autores nunca foram identificados, não se prendiam de forma alguma com matérias "sensíveis" que eventualmente Pacheco Pereira estivesse a investigar e/ou divulgar.

Enquanto os atingidos pelos textos dos outros cinco blogues estavam bem identificados, de tal forma que levou estes a reagirem e a virem a público, no caso "Abrupto" ninguém é atingido em particular que se consiga identificar. Se quem lhe pirateou o blogue não gostava de algum dos seus escritos, nunca soubemos, e muito menos se tinha origem no Poder, ou poderes.

Pela foto da capa somos tentados a concluir que o objectivo era silenciar os seis blogues e por consequência os respectivos autores. Essa tentativa de silenciamento é notória nos blogues cujos autores são identificáveis - que não Pacheco Pereira, que nunca, pelos menos que se saiba, foi alvo de qualquer processo judicial - e que não se movimentam nos "corredores" do Poder, ou poderes.

Quanto aos blogues de autoria anónima, as movimentações são para que o autor, ou autores, saiam do anonimato e assumam aquilo que escrevem  e que respondam judicialmente pelos possíveis crimes cometidos, na opinião dos visados.

Nenhum dos blogues anónimos escolhidos por Pedro Fonseca chegou com "vida" aos nossos dias. Porquê? Porque sentiram que o cerco se apertava ao "dizerem-lhes", pelos mais variados meios, que dia menos dia, caso continuassem a desenvolver a sua actividade, seriam identificados e desmascarados. Essas ameaças em crescendo, chegando ao ponto de descreverem várias formas possíveis de os apanhar, fê-los recuar e desistir. Provavelmente, nunca saberemos se o auto-silenciamento foi por receio de retaliações de vária ordem, embora o que escrevessem até pudesse ser verdade, ou simplesmente sabiam que o que escreviam era completamente falso, e logo sem qualquer hipótese de justificação e, como todos os covardes seguiram a máxima: "entradas de leão, saídas de sendeiro".

Pedro Fonseca tenta, embora aqui e ali não consiga, não tomar posição sobre os custos reais e concretos que se abateram em cima dos autores dos blogues identificáveis, pelo uso da liberdade de expressão, não falo em custos em relação aos autores anónimos, porque esses não sofreram nada, quando muito assistiu-se a avisos à navegação futura, potencialmente anónima.

Dos visados identificados pela autoria dos blogues em análise, ou daqueles  cujo trabalho se socorreu e que estão, ou não, identificados no livro, Pedro Fonseca deveria esperar que os mesmos viessem a público dizer de sua justiça, quanto mais não fosse pelo muito que copiou, e, que segundo alguns, não se deu ao trabalho de pedir licença. Foi o que sucedeu.

(continua)

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