3 de julho de 2007

Equívocos que vêm por bem

Todos os posts publicados no Poviléu procuram traduzir factos verídicos, isso não invalida que não cometa erros. Embora, como é natural, esteja espelhado em cada post a visão do autor sobre o assunto em foco, procura-se sempre que a opinião emitida se baseie em factos reais. Os blogues, assim como tudo o que produz informação, não estão imunes ao erro, quer por acção directa, quer por acção indirecta devido às fontes.

Além dos erros factuais, deliberados ou não, cada um fala por si, existem os chamados equívocos, lapsos. Por vezes as boas intenções levam a que não se seja preciso. O voluntarismo traz destas coisas.

Embora também já tenha aqui referido que um blogue não é um jornal, isso não impede que não se cumpra, tal como em tudo na vida, um código ético e uma conduta tendentes à verdade. O Poviléu pretende percorrer esse caminho e, sempre que seja detectado um erro, omissão ou imprecisão, cá estaremos para repor a verdade dos factos, sob pena de se perder toda a credibilidade. Uma coisa são opiniões divergentes, que é de salutar, outra coisa, bem diferente, é deturpar os factos. Em suma: mentir. Mentir deliberadamente com intenção de atingir outros fins: aqui não.

Posto isto, há que repor a verdade.

No dia 1 de Julho, anteontem, publiquei aqui um post intitulado: "Mundo livre", em que na senda da polémica queixa-crime apresentada pelo Primeiro-Ministro, José Sócrates, contra o autor do blogue Do Portugal Profundo, António Balbino Caldeira, fui buscar exemplos de blogues de alguns países da Europa, Brasil e Estados Unidos, que se debruçassem sobre aspectos da política interna dos respectivos países, com o objectivo de demonstrar que, aqueles blogues por criticarem os seus dirigentes políticos, estes nunca apresentaram queixas-crime contra os autores dos blogues exemplificados. Escolhi blogues individuais, não institucionais, por analogia com o caso português.

Ao não saber falar, nem escrever alemão, não deveria escolher qualquer blogue originário da Alemanha, para exemplificar a "liberdade de expressão" na Alemanha. Mas escolhi. Como? Fiz uma pesquisa na Internet em várias línguas sobre blogues activos que se dedicassem à política interna dos respectivos países. Como a língua alemã tem algumas palavras similares ao inglês, pus-me à procura do que haveria na língua de Goethe.

Estranhamente não encontrei muitos, pese embora o peso demográfico e a importância da Alemanha, que se dedicassem, em nome individual, à política alemã. Houve, no entanto, um que me chamou a atenção, por ter uma imagem com uma cruz por cima, que demonstrava que aquele autor não aprovava o governo alemão actual, da chanceler Angela Merkel. Por algumas palavras soltas, as tais parecidas com o inglês, a impressão com que fiquei foi que o autor de facto criticava o governo alemão.

O blogue em causa era, e é: Mein Parteibuch, sediado em solo alemão, de domínio "de". Não notei que o autor, Marcel Bartels, não publicava qualquer post desde Janeiro último. E isso fazia toda a diferença, ao contrário da caixa de comentários que se mantinha activa até final de Maio passado, demonstrado interesse por parte dos leitores.

Marcel Bartels entrou em contacto comigo, via caixa de comentários, mas não sabendo português, apercebeu-se que o Poviléu, pelo logótipo colocada na barra lateral, era contra a censura e, pediu-me para entrar em contacto com ele, em inglês.

Assim fiz, via correio electrónico, e expliquei-lhe o propósito do meu post e da escolha do seu blogue como exemplo alemão de que se podia criticar o governo e os políticos, exercendo o direito à liberdade de expressão, e respeitando os limites da mesma, sem se ser processado pelos detentores do poder. Como o post era fruto da polémica que envolve o percurso académico do Primeiro-Ministro, a que a comunicação social tradicional e os blogues portugueses deram, e ainda dão, ampla cobertura, o que levou a que o autor do blogue Do Portugal Profundo fosse processado, provavelmente, pelo facto de ter sido o primeiro a trazer o caso para o espaço público, transmiti-lhe esses dados todos, para enquadrar a escolha do seu blogue.

Pois bem, nem de propósito, Marcel Bartels, o autor do blogue alemão tem sido perseguido pelo poder político alemão, tendo visto-se na obrigação de encerrar o blogue em solo alemão e transferi-lo para servidores fora da Alemanha, por recear a eminência do seu encerramento, por imposição do poder judicial alemão. Daí não haver posts posteriores a Janeiro de 2007, porque Marcel Bartels transferiu o blogue para o seguinte endereço: http://www.mein-parteibuch.com.

Voltarei a este assunto em posts posteriores. Fiquei a saber como as coisas se processam na Alemanha no tocante a blogues indesejáveis. Mas não só. Afinal, a liberdade de expressão dentro da União Europeia tem muitas matizes.

Por comparação com a Alemanha, a liberdade de expressão em Portugal está mais defendida, legalmente. Ou antes, estava, porque o caso "Do Portugal Profundo" veio pôr em causa os limites da liberdade de expressão no espaço público. Principalmente e, sobretudo na Internet.

O blogger alemão Marcel Bartels escreveu um post, em alemão, sobre o que se está a passar em Portugal.

Voltaremos à liberdade de expressão na Europa, porque como é evidente em África, na Ásia e em alguns países da América Latina, o problema não se põe. Simplesmente sabe-se de antemão que, não existe liberdade de expressão.

Pedro Correia no Corta-Fitas, no post "Uma bofetada aos medrosos", também do dia 1 de Julho passado, se referia ao post "Mundo livre" do Poviléu, por forma a ilustrar que nas democracias ocidentais havia de facto liberdade de expressão. Pois Pedro, lamento também tê-lo induzido em erro.

Embora a liberdade de expressão esteja consagrada nas leis desses países, a realidade por vezes é bem diferente. Pelo menos na Alemanha.

4 comentários:

Anónimo disse...

Muitíssimo interessante, isto. Impecável. Já tinha feito a mesma pergunta ("será que mais algum governante, no mundo dito civilizado, processou um blog por delito de opinião?") e pensava realmente que fosse caso único, o "nosso". Mas olhe que, se o "caso" português é complicado, esse do blog alemão também não deve ser fácil de entender; principalmente por causa da Língua, como refere. Será mero "delito" de opinião ou algo mais? Certamente, o próprio Marcel Bartels não pôs em causa as habilitações académicas de ninguém...
Digo eu...

Paulo Carvalho disse...

JPG

Ainda estou a recolher material, mas posso adiantar que o último processo se prende com a questão de uma foto de um ministro alemão. O ministro obrigou o blogger a retirar a foto, sob pena de processo. A foto é normalíssima. Em futuros posts darei conhecimento do que se trata. Outro caso prende-se, a que também darei voz, com o facto desse blogger ter posto em causa as habilitações literárias do presidente palestiniano. A justiça alemã anda atrás dele. Aquilo por aquelas bandas não é pêra-doce. No entanto ele disse-me que as coisas nunca chegam a um nível tão alto, como está a ocorrer cá. De facto,um primeiro-ministro pôr-se à frente é caso inédito. Eles lá, como cá, usam outros estratagemas para conseguir levar a água ao moinho. Mas com este grau de exposição por parte de um primeiro-ministro parece que é caso virgem. Pois não foi o Estado a processar, foi o próprio.

Anónimo disse...

É imparável a força para a LIBERDADE, em toda a sua essência.

Anónimo disse...

Bom, então haja calma. Realmente, se é de uma foto que se trata, então o caso muda de... figura. O direito de imagem cobre qualquer espécie de... imagem; por mais "normalíssima" que seja a foto! Ninguém pode publicar uma "chapa" de outrem sem autorização.
Enfim, aguardemos pela conclusão da sua investigação. Sinceramente, não acredito que o caso DPP tenha precedentes.
Os meus sinceros parabéns pelo seu trabalho e, principalmente, pela forma escorreita como está redigido - coisa raríssima e admirável, nos tempos que correm.